sábado, 22 de setembro de 2007

Redação e Estilo

Diretor de redação da Veja São Paulo, Carlos
Maranhão dá a receita de um bom texto

Carlos Maranhão é curitibano e mora em São Paulo há 30 anos, praticamente o mesmo tempo em que está na Editora Abril. Desde 1991, dirige a Veja São Paulo. Reconhece que o mercado de trabalho está disputado, mas acredita que as pessoas talentosas encontram o seu lugar. Aos novos jornalistas recomenda empenho, determinação e, sobretudo, leitura. Maranhão já foi repórter, editor e diretor de redação das revistas Playboy e Placar.

O mercado está muito disputado. Como realizar o sonho de trabalhar na grande imprensa?
Há 30 anos ouço isso de jovens jornalistas. Em geral, não existem vagas. O mercado está saturado. Mas quem nasceu para ser jornalista, tem brilho e competência cedo ou tarde encontrará seu lugar. Cada vez que preciso contratar alguém, é muito difícil, porque, apesar de sempre receber currículos, raramente vejo um repórter diferenciado. Eles não nascem todo dia. A missão do novo jornalista é ser muito bom. Tem que batalhar, estudar, ler e entender a publicação em que trabalha. Para as pessoas talentosas, determinadas e com garra, a chance de encontrar colocação no mercado é bem razoável.

Prática e trabalho duro podem substituir o talento?
O talento é só a base. Procuramos pessoas com predisposição natural para o jornalismo. Mas também esperamos dedicação, estudo e muito trabalho. Se você não tem vocação jornalística, por mais que se esforce, vai ser sempre medíocre. Para ser cirurgião e desenhista também é preciso talento. Por que para escrever não seria? Além disso, o jornalista deve ser curioso para descobrir coisas exclusivas e contar aos leitores.

BOM REPÓRTER

As qualidades atribuídas ao bom repórter, como a disposição para gastar sapato na rua, ainda valem nas atuais redações?
Sempre que possível, as matérias devem ser apuradas in loco. Sem falar pessoalmente com a fonte, ver onde ela trabalha, o que veste e como olha para você enquanto responde as perguntas, as matérias ficam muito iguais, pasteurizadas. Nas redações, grande parte dos repórteres apura pelo telefone, pela internet e com a ajuda de assessores de imprensa. Eu digo sempre que reportagem se faz na rua.

Essa "pausteurização" das matérias uniformiza os textos, que são assinados como "da redação" ou "reportagem local". Como você encara isso?
Quanto ao crédito, as revistas e jornais deveriam assinar apenas as matérias que fazem a diferença, seja pela qualidade da apuração, seja pela qualidade do texto. Acho que a assinatura está muito banalizada. Tem que ser um mérito e não uma coisa automática. Na revista The Economist, considerada uma das mais bem escritas do mundo, as matérias não são assinadas, com raríssimas exceções.

Além da The Economist, quais revistas se destacam hoje no Brasil e no mundo?
Entre as semanais de informação, a Time e a Newsweek. Destaco a Time por ter criado a fórmula de semanais, que está permanentemente se renovando. A The Economist é excepcional, sobretudo por causa da qualidade das análises. Na Veja São Paulo, nos espelhamos muito na The New Yorker, que faz nos EUA o que buscamos fazer aqui. No Brasil, acho que a Veja tem um padrão de qualidade muito acima da de qualquer outra publicação.

ANÁLISE

Falta análise no jornalismo brasileiro?
Acho que análise e opinião são diferenciais que as revistas semanais deveriam ter sempre. A Veja persegue isso sistematicamente e costuma fazer boas análises socioeconômicas e políticas. Opinião e análise são, aliás, o que há de mais interessante nos jornais diários. Os artigos e editoriais são geralmente bem escritos. A Folha, o Estadão e O Globo têm boas equipes de articulistas. Nos artigos, o leitor encontra a contextualização, que o ajuda a compreender o mundo.

Os jornais estão chatos?
Creio que um dos grandes desafios do jornalismo é tornar interessantes as matérias importantes. Eu leio os jornais um pouco por obrigação. Deve existir um jeito de apresentar isso aos leitores de forma mais atraente. Acho os jornais grandes demais. Mas todos os jornalistas têm obrigação de ler jornal.

BOM TEXTO

Como tornar o texto mais atrativo?
Antes de tudo, a matéria deve ser bem apurada. Depois, bem pensada. O repórter deve refletir sobre o assunto da matéria e a maneira como irá abordá-lo. E finalmente tem que ser bem escrita e editada. Assim, vai resultar num bom texto, que vai atrair o leitor. Tem que ir direto ao ponto sendo objetivo e claro.

Você acredita que os cursos de comunicação têm cumprido seu papel na formação de jornalistas com essa qualidade de texto?
As faculdades têm apenas parte do mérito na formação do jornalista. Dou muita importância aos ensinos fundamental e médio, às escolas e cursos que o candidato freqüentou. Para quem estuda numa faculdade de ponta, difícil de passar, geralmente é mais simples entrar no mercado. Isso não é pelo curso superior em si, mas pela formação escolar, que permitiu a aprovação num vestibular em que a relação candidato/vaga é brutal. Sou a favor dos cursos de jornalismo, mas não necessariamente da obrigatoriedade do diploma universitário. A pessoa poderia fazer filosofia, história ou economia e depois uma especialização em jornalismo, como acontece com bastante sucesso em alguns países.

Fonte: Curso Abril de Jornalismo

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